Artigo de opinião: Filme Sinners

13 de jul. de 2025

"Sinners": Quem São os Verdadeiros Pecadores no Mississippi de Ryan Coogler? Desde o momento em que soube sobre "Sinners", o novo filme de terror sobrenatural de Ryan Coogler, algo me intrigou profundamente. Mergulhar no Mississippi Delta de 1932, um lugar e tempo tão marcados pela opressão e segregação racial, já me preparava para uma experiência intensa. Mas o que eu não esperava era que o filme me fizesse questionar a própria essência do que chamamos de "pecado".

"Sinners": Quem São os Verdadeiros Pecadores no Mississippi de Ryan Coogler?

Desde o momento em que soube sobre "Sinners", o novo filme de terror sobrenatural de Ryan Coogler, algo me intrigou profundamente. Mergulhar no Mississippi Delta de 1932, um lugar e tempo tão marcados pela opressão e segregação racial, já me preparava para uma experiência intensa. Mas o que eu não esperava era que o filme me fizesse questionar a própria essência do que chamamos de "pecado". Coogler, com sua maestria narrativa, usa o terror não apenas para nos assustar, mas para nos confrontar com uma análise social e cultural tão pungente que nos leva a desafiar as normas, os rótulos e, acima de tudo, a origem da verdadeira maldade.

A escolha do título "Sinners" – "Pecadores" – me parece, por si só, uma provocação genial. Pense comigo: ao longo da história, povos não-brancos, especialmente aqueles que sofreram a violência da colonização e a imposição do cristianismo, foram rotulados como "pagãos" e, claro, "pecadores". Suas culturas vibrantes, suas espiritualidades ancestrais e seus modos de vida foram demonizados, tudo para justificar a supressão e o apagamento de suas identidades. O que era "certo" ou "divino" era ditado por uma norma branca e ocidental, transformando tudo o que dela divergia em algo "pecaminoso". Em "Sinners", Coogler inverte essa narrativa de forma brilhante. Os irmãos Smoke e Stack Moore, veteranos de guerra e, sim, criminosos, buscam uma nova vida. Suas ações, embora questionáveis, são impulsionadas pela sobrevivência e pelo desejo de criar um espaço de dignidade para sua comunidade negra em um mundo que lhes nega isso. Eles e o povo que tentam proteger poderiam ser vistos como os "pecadores" aos olhos daquela sociedade opressora. No entanto, o filme rapidamente me fez perceber que os verdadeiros pecadores estavam em outro lugar.

Para mim, não há dúvida de que os símbolos mais claros da maldade em "Sinners" são as figuras que representam a Ku Klux Klan. Eles personificam o racismo sistêmico, a violência brutal e a injustiça que sufocava a comunidade negra. O ódio deles é visceral, suas ações são indefensáveis, e eles são a manifestação mais cruel do terror terreno, histórico, que ceifou vidas e esmagou a liberdade por gerações. O KKK, nesse contexto, não é uma metáfora; é a encarnação do mal que oprime e destrói sem piedade.

A introdução dos vampiros, liderados por Remmick, um irlandês, me intrigou bastante e adicionou uma camada de complexidade fascinante. Sabe, historicamente, os irlandeses também foram um povo colonizado e oprimido. Essa escolha do diretor me parece intencional. Ela sugere que a opressão, em suas diversas formas, pode criar um ciclo perigoso. Grupos que foram vítimas podem, paradoxalmente, tornar-se agentes de opressão em outros contextos. Remmick, mesmo sendo um vampiro, pode ter experimentado sua própria marginalização, mas isso não o absolve de seu papel como predador. Ele até prega uma distorcida "igualdade", o que me fez pensar em como ideologias opressoras podem se mascarar de justas para atrair e manipular. Os vampiros em "Sinners" funcionam como uma metáfora potente para a exploração. Eles sugam a vida, a essência e a vitalidade de suas vítimas, refletindo como o racismo, a pobreza e a exploração cultural drenam uma comunidade. O blues, que no filme possui um poder místico e espiritual, torna-se um alvo dessas forças malignas, sublinhando a exploração da cultura negra e a constante ameaça à sua própria existência e expressão.

No final das contas, "Sinners" me forçou a reavaliar quem realmente carrega o fardo da "pecaminosidade". Para mim, não são aqueles que, como os irmãos Moore, lutam para sobreviver e construir algo para si e para os seus em um mundo hostil. Os verdadeiros pecadores são os que perpetuam a opressão, o ódio e a exploração, seja através da violência racista do KKK ou da insidiosa drenagem de vida dos vampiros. O filme celebra a resistência cultural, a resiliência indomável do espírito humano e a contínua luta pela dignidade, mesmo quando rotulados e marginalizados por aqueles que detêm o poder. "Sinners" é mais do que um filme de terror; para mim, é um espelho que reflete as injustiças do passado e as ressonâncias dolorosas no presente, me compelindo a questionar: quem, de fato, são os pecadores em nossa própria história e em nossa sociedade hoje?


Esse é um artigo de opinião, de autoria própria.

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Bárbara Hirle - Psicóloga Clínica © 2025. Desenvolvido por 🧡 Be Seven

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